segunda-feira, 5 de maio de 2008

Suzana Cloud

A Lua estava cheia e Suzana repousava sobre o pufe de couro em seu quarto. Caía uma chuva fria e fina que fazia o cheiro dos gerânios sob o batente acentuar-se, a luz lunar recortada pela janela dava à garota um ar fantasmagórico.
O cortinado pupúreo de repente balançou e o vento entrou no quarto passando veloz por seu ouvido. Um tremor tomou conta de Suzana, levantou-se de um salto.

- Arrume meu cabelo, vá e diga-lhe que estou indo.
O vento rugiu, as mechas começaram a entrelaçar-se e formaram uma trança perfeita. A cortina voou e o vento se foi. O ar ficou parado e anormalmente quieto.

Abriu o guarda-roupa e tirou uma capa azul marinho, mirou-se na tela do computador desligado, pegou a mochila e saiu do quarto. Rabiscou um bilhete para a mãe, passou pela porta e a trancou.
Caminhou longa e silenciosamente pelas ruas transpostas pelo luar. O capuz encobria seu rosto, os chaveiros tintilavam em sua mochila compassando com seu andar, parou, sentou-se num banco de concreto e ali ficou.

Consultou o relógio impacientemente. Um vulto dobrou a esquina, uma capa carmim esvoaçava, caminhou rápido e sentou-se ao lado de Suzana.

- Você demorou.

- Tive uns contratempos. Está muito bonita hoja, Su.

- Obrigada... Estás linda como sempre. Mas diga o que é tão urgente.

Junie fitou-a com apreensão.

- Bem, você acabaria descobrindo... Adário adiou mais uma vez o casamento.

Os olhos amarelados de Suzana encontraram os negros de Junio e as duas sorriram.

- Olha, vim aqui para te dizer... Não tenha esperanças.

E ao falar, uma sombra tomou sua expressão.

- Eu sei que não deveria.
- Eu vou te ajudar.

- Como? Ora, Junie! Você é uma Hoo... Jolie vai me ajudar.

- Ah, Su! Não vou ajudá-la com meus poderes.
- E o que vai fazer?

- Digamos que vamos passear...

- Certo... Pelo que te conheço, não vai me contar... Então, por hora, vamos ao Javali?

- Mas fica longe e não vejo nuvens no céu.
Suzana sorriu, colocou a mão no decote, puxou um fino fio prateado com um pequeno apito e soprou um silvo fino e claro.

Intantaneamente a Lua foi encoberta por um ajuntamento denso de nuvens roxas. Os olhos de Junie se arregalaram.

- Como você fez isso? Nenhum cloud consegue chamar nuvens tão rápido.
- Lembra daquela viagem que eu fiz à Hollow?
- Sim... Mas o que tem?
- Eles fizeram este apito pra mim. É encantado, dentro dele tem a essência da minha voz, ele reproduz de uma forma mais sensível às nuvens. Mas não conte a ninguém.

- Certo, vamos?

Junie se divertia nas alturas e Suzana se divertia com o sorriso de Junie, porque é assim que os amigos deveriam ser. Desceram no Javali Saltitante. O bar estava vazio exceto pelo barman.

- Boa noite Robie... Tudo bom?
- Sim sim, senhorita... O de sempre?

- Sim...

- E a senhoria Junie vai querer o de sempre também?

- Sim, água.

Quando Robie trouxe as bebidas, porém, o sino da porta ressoou e o vento cortante do inverno entrou. Era Adário.

- Nossa... Como este bar está vazio... Olá, Junie... Suzana.

Com uma reverência curta ele se juntou a elas e pediu a bebida ao garçom. As garotas trocaram olhares significativos.

- Engraçado você aparecer por aqui em plena segunda, Adário...
- É? Me deu vontade de beber e eu sabia que encontraria vocês aqui.
- Como? - perguntou Junie interessada.

- Hum... Acho que eu ouvi por aí.

Suzana levantou uma pestana... Sabia que o vento contara isso a ele. Pagou a bebida dos três para Robie.

- Preciso ir. Quer uma carona, Ju?

- Não precisa...
- Ok... Bom, tchau para os dois.
Ajeitou o cachecol sobre a boca e o nariz para proteger-se do frio, mirou os olhos de Adário e com um aperto no coração saiu do Pub.
Não sentia vontade de usar as nuvens naquele dia. Caminhou com as mãos nos bolsos até a estação de trem. Entrou num vagão de aspecto abandonado e encardido.
As portas se abriram na estação seguinte e na outra... Mas ninguém entrou até a quarta parada. Com um estrondo metálico, as folhas das portas deslizaram e um rapaz entrou. O trem estava vazio, mas ele sentou ao lado de Suzana e olhou-a dentro dos olhos. Ela sustentou o olhar... Não que fosse corajosa encarando outras pessoas, mas aquele olhar tão penetrante era agradável.
- Oi. Parece que eu conheço você... De algum lugar... Mas não me recordo. Meu nome é Pedro.
- Engraçado que eu também tenho essa sensação... Meu nome é Suzana, muito gosto.



...Continua...

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